Créditos de carbono: entenda de uma vez o mercado de CO2



O mercado de mitigação de emissões por meio de mercado sustentável ainda é muito complexo, e ainda engatinha, porém, "o trem já saiu da estação" e ganha cada vez mais visibilidade e peso dentro do mercado e entre investidores.

Segundo analista da economia verde, o mercado de carbono movimentou quase 1 trilhão de dólares somente em 2022.

 

 


O mercado de crédito de carbono ainda vai ganhar mais solidez e esperança para quem tem como objetivo viver melhor.


 

Preocupada com as mudanças climáticas, órgão internacionais têm trabalhado muito para reduzir as emissões dos gases que provocam o efeito estufa (GEE).1

Os esforços dos acordos internacionais busca interromper a degradação da natureza, além de estimular que os países convertam as suas matrizes energéticas para uma matriz mais limpa e, dessa maneira, evitar a emissão dos gases do efeito estufa.

Os green bonds, nome em inglês dado aos créditos de carbono, são títulos de créditos vinculados, exclusivamente, com o objetivo de financiar projetos que tenham um impacto positivo para o meio ambiente, como é o caso das florestas plantadas, energias renováveis, construções ecológicas, entre outros tipos de projetos sustentáveis.

É um nascente mercado, mas já vem enorme, estimado em um trilhão de dólares para 2023, e pode atingir U$ 130 trilhões.

A emissão começou com capital público, com a União Europeia, o Banco Mundial e a Fanny Mae (EUA) injetando dinheiro em projetos ecológicos. Depois dos investimentos públicos, empresas privadas, como Pepsi e Verizon, passaram a ivestir no mercado de carbono.

 

 


Como é fixado o valor do crédito de carbono


A expressão "mercado de carbono" se consagrou, mas o correto é entender que falamos de todos os gases de efeito estufa (GEE) que elevam a temperatura do planeta. Quando nos referirmos a "carbono", estamos nos referindo aos GEE.

As ações para a redução das emissões de GEE podem envolver: 1. Descarbonizar os processos de investimentos, 2. Alterar a geração de energia para meios renováveis, 3) Melhorar a eficiência energética das edificações, 4. Criação de distribuidoras de energia locais, 5. Encerrar a geração de energia oriunda do carvão, e 6. Mudança da economia linear para a economia circular, na qual há reciclagem do lixo, aproveitamento da energia não usada ou do carbono liberado, e coleta e separação dos detritos para seu reuso.

O sistema de créditos de carbono usa a lógica de mercado para precificar. Uma empresa elabora um projeto indicando o volume de toneladas de redução do GEE, emitindo títulos de crédito correspondentes. Pelos padrões internacionais, cada crédito de carbono representa uma tonelada métrica de dióxido de carbono evitada ou removida (tCO2e). A redução de carbono se materializa em títulos de crédito que podem ser negociados para empresas cujas emissões de carbono são superiores que, por sua vez, poderão compensar o excesso com estes títulos. Feita a compensação, o título se exaure, aposenta-se, pois não pode ser reutilizado.

Estes títulos de crédito são causais, ou seja, decorrem da não geração ou da redução da emissão de créditos de carbono. Eles são negociáveis, podendo ser cedidos, mas a lei deverá indicar o momento de sua extinção em decorrência de seu exaurimento.

Como todo mercado emergente, o sistema de emissão e comércio de créditos de carbono se ressente de metodologia e mensuração confiáveis, o que deverá ocorrer com a maturação dos projetos e regulação adequada pelos organismos internacionais e por cada país. Somente assim, o mercado terá padrões de segurança para os investimentos.

 


O PL 412 - Aprovado no Senado Federal


 

O PL 412, que institui o SBCE - Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa, principia com uma lista de definições que são fundamentais para orientar o novo mercado. O inc. XV, do art. 2º, por exemplo, foca no problema da metodologia informando que o sistema deve mensurar, relatar e verificar de forma padronizada as emissões por fontes ou remoções por sumidouros, bem como as

reduções e remoções de gases de efeito estufa decorrentes da implementação de atividades, programas ou projetos.

O mais importante para o mercado de crédito é a criação do sistema, com princípios e agentes estatais reguladores, a definição dos ativos integrantes do sistema e a possibilidade de negociação desses ativos, inclusive os créditos de carbono, no mercado financeiro e de capitais, seja na Bolsa de Valores, com supervisão da CVM - Comissão de Valores Mobiliários ou fora, num regime de livre negociação.

Os ativos devem ser lançados na plataforma digital de Registro Central do SBCE, que receberá e consolidará informações sobre emissões e remoções dos GEE, controlará a concessão, aquisição, detenção, transferência e cancelamento de ativos integrantes do SBCE, e, finalmente, rastreará as transações nacionais sobre os ativos integrantes do SBCE e transferências internacionais de resultados de mitigação.

Insegurança, um problema brasileiro e... global

O primeiro leilão de créditos de carbono realizado pela bolsa B4, em agosto de 2023, decepcionou: apenas 1% dos créditos listados obteve aprovação, situação que, de acordo com a B4, demonstra que o greenwashing ("lavagem verde", em inglês), isto é, o ato de oferecer ações falsas de sustentabilidade também estaria ocorrendo no mercado brasileiro de carbono.9 Repito, invertendo o dado: 99% dos créditos listados foram reprovados.

Contudo, este não é um problema só brasileiro, é mundial. Reportagem dos jornais The Guardian e Die Welt indicou que 94% dos créditos de carbono credenciados pela maior empresa do mundo, a Verra, seriam imprestáveis e, pior, podem colaborar para o aquecimento global.10 Os padrões fixados para a certificação, aparentemente, não são adequados.11

Somente enfrentando esta descrença, fixando os padrões e mensurando dados confiáveis, o mercado de créditos de carbono poderá obter a credibilidade necessária para receber os aportes financeiros imensos que são necessários para frear a emissão dos GEE.

A atividade notarial para segurança e regulação do mercado de carbono

No mercado aberto internacional de créditos de carbono, as empresas certificadoras dos projetos têm sempre exigência de um verificador previamente credenciado e aprovado por elas. Este verificador é um terceiro imparcial, um

profissional ou empresa com conhecimento técnico dos padrões estabelecidos e que fará a auditoria do projeto e da evolução de seus propósitos.

No séc. XIII, os comerciantes e banqueiros criaram a Letra de Câmbio, provocando uma disrupção valiosa no mercado financeiro, integrando as economias e multiplicando o comércio. Como o crédito de carbono, a letra de câmbio é um título causal, fundado num negócio, e pode circular através de sucessivos endossos. Para certeza da mora do devedor perante terceiros, os cessionários, os credores buscaram a fé pública do tabelião, que intima o devedor para aceite ou para pagamento. Vem daí o protesto notarial de títulos, a busca da certeza estatal para uma situação negocial. Foi uma solução singela, rápida e que se provou eficaz para a segurança e desenvolvimento do comércio.

O mercado de crédito de carbono, como ocorreu com a letra de câmbio, poderá se beneficiar da intervenção notarial.

O tabelião de notas é o profissional com delegação do Estado, presente em todo o Brasil, a maioria com formação jurídica e aprovada em concurso público. Trabalha sob fiscalização das Corregedorias estaduais dos Tribunais de Justiça e do CNJ.

Os tabeliães utilizam minutas que podem ser uniformizadas por ato do CNJ, permitindo um documento padrão, de fácil compreensão dos investidores, contendo os dados imprescindíveis para a certeza do crédito e do investidor.

O treinamento e capacitação dos 8.500 tabeliães de notas brasileiros pode ser feito em prazo curto12 pelo Colégio Notarial do Brasil, e os atos podem ser feitos na plataforma digital e-Notariado, mantendo os registros e operar a transmissão eletrônica e instantânea para a plataforma do SBCE. Os tabeliães de notas brasileiros integram a União Internacional do Notariado, na qual estão presentes 91 países, entre eles a Europa Continental, a China e a Rússia. Com isso, o prestígio e reconhecimento institucional da atuação notarial dará confiança ao investidor estrangeiro e estimulará o tráfego internacional dos créditos de carbono emitidos aqui.

Concretamente, os tabeliães poderiam elaborar uma escritura de emissão de títulos de crédito de carbono vinculadas ao Projeto x. Neste instrumento, o tabelião verificará e atestará: a) o registro do projeto junto aos órgãos competentes; b) a identidade e capacidade civil dos proponentes, com verificação de sua participação e representação na empresa; c) a titularidade dos direitos relativos ao projeto; d) a constituição e execução do projeto; e e) as declarações dos proponentes e obrigações assumidas.

A ata notarial, o instrumento que atesta a existência de algo pré-constituindo prova (CPC, art. 384), pode ser largamente utilizada para garantia dos proponentes, dos investidores e do SBCE. Vejamos algumas sugestões:

- Ata de verificação do local do projeto e existência de suas premissas, informando que: a) o projeto atende as normas e demais exigências técnicas; b) as metodologias estão aplicadas corretamente; c) as leis locais e seus regulamentos são respeitados; d) o projeto não induz a efeitos negativos para a comunidade local; e e) outros requisitos previstos no regulamento.

- Ata de emissão e vinculação dos créditos de carbono ao projeto verificado, evitando a multiplicação de emissão no mesmo projeto, bem como a verificação da circulação escritural dos créditos, seja nos mercados tradicionais, com seus mecanismos de custódia, ou em blockchain (CC, art. 889, § 3º).

- Ata periódica sobre a evolução e sequência do projeto, de suas metas e resultados, como previsto na proposta e na regulamentação.

Importância existencial e econômica, o futuro do planeta

O mercado de carbono é essencial para a redução das emissões dos GEE. É incipiente e necessita de recursos trilionários para a sua implementação. Constitui-se num avanço de nossa civilização, que poderá seguir o seu desenvolvimento econômico com energias sustentáveis sem agressão à atmosfera, do que, afinal, dependemos para sobreviver.

O aproveitamento do tabelião como ente verificador independente e capacitado, com presença em todo o país, possibilitará que os investidores nacionais e estrangeiros tenham confiança nos projetos e créditos de carbono aqui emitidos. Com isso, o Brasil poderá aproveitar o nascente mercado dos green bonds, explorando com inteligência e equilíbrio ecológico os seus imensos recursos naturais.

O Brasil tem realizado esforços para atender aos compromissos ambientais assumidos no Protocolo de Quioto (1997) e no Acordo de Paris (2015). O ecossistema legal brasileiro para a proteção ambiental conta com a lei 12.187/09, que institui a PNMC - Política Nacional sobre Mudança do Clima e fixa parâmetros claros para a redução dos GEE, a lei 12.651/12 (Código Florestal), e o decreto 11.550/23, que dispõe sobre o Comitê Interministerial sobre a Mudança do Clima.

A lei 12.651/2012 introduziu, no Brasil, o crédito de carbono, definido como um título de direito sobre bem intangível e incorpóreo transacionável (art. 3º, inc. XXVII). Também nela, há que se destacar a criação das áreas de preservação adotadas pelo país para o meio ambiente, a área de reserva legal obrigatória, cujos índices variam de 80% a 20%, nunca menos, e a área de preservação permanente. Além disso, foi instituído o CAR, o Cadastro Ambiental Rural obrigatório para todas as propriedades rurais (art. 29).